sexta-feira, 28 de maio de 2010

Festas de aniversário

Sei que posso parecer antiquado, mas sou do tempo em que quando se convidava uma pessoa para a sua festa de aniversário, você não tinha de pagar para comer e beber. Quando se consulta a palavra "convite" no dicionário Houaiss, vê-se que uma das acepções refere-se a um bilhete que dá direito à entrada GRATUITA. Embora outras acepções não explicitem a idéia de gratuidade, a própria etimologia da palavra — do catalão convit —, que faz referência aos banquetes, agrega-a.

Não sou antiquado, mas saudosista (Uma pequena digressão minha... Nostalgia não é sinônimo de saudosismo: aquela traz consigo a melancolia, enquanto esta não necessariamente. No meu conto "Cinco Cigarros", trato a nostalgia como um "saudosismo ressentido"). Tenho saudades do tempo em que o convite para o comparecimento a um aniversário era um requerimento da pessoa e não do bolso. É engraçado ver, também, que os aniversariantes costumam convidar-nos para estabelecimentos que não cobram dos aniversariantes, a partir de um certo número de convidados. Se for para dizer que alguém é sovina na história, não sou eu, mas o aniversariante.

Possam, talvez, argumentar que o dinheiro que era utilizado na compra de presentes foi substituído pelo dinheiro que se gasta para comer no estabelecimento; contudo, até onde saiba, o presente nunca foi obrigatório. Possam, outrossim, dizer que, da mesma forma, não é obrigatório que o convidado gaste dinheiro comendo e bebendo, mas convenhamos que é muito pior gastar algumas horas observando todos comendo e bebendo, especialmente se o estabelecimento for um local de rodízios, do que apenas não levar um presente.

Faz algum tempo que não sou afeto a aniversários e explico por quê. Qual o significado do aniversário? Bem, comemora-se o dia em que você nasceu. É um dia representativo portanto, já que a data do seu nascimento não voltará. O tempo, pelo menos sem nos aprofundar muito, é linear. Imaginem uma reta numerada. Digamos que o zero é fixado na reta quando você nasce e que os números subseqüentes representam o passar do tempo. Você nunca voltará à estaca zero, mas, no máximo, poderá criar um espaçamento fixo para comemorar o que você denominará de aniversário.

Escolheu-se o ciclo da Terra ao redor do Sol para denominar-se o que chamamos de "ano"; contudo, qualquer outro ciclo poderia ser escolhido para chamarmos-lhe de ano. Voltando ao exemplo da reta, qualquer espaçamento do ponto fixo zero poderia ser escolhido para comemorar-se os aniversários. Tive esse raciocínio há alguns anos, mas alguns conceitos que aprendi posteriormente acrescentaram algumas idéias sobre ele.

Aprendi, estudando Física, os conceitos de Isotropia e Anisotropia. Para quem não conhece os termos, mas sabe um pouco de Grego, saberá que "iso" significa "igual", "tropos", "lugar" e "ánisos", "desigual". Para resolvermos alguns problemas, supomos que o Universo é isotrópico, ou seja, que ele tem as mesmas propriedades físicas independentemente da direção escolhida. Sempre fui um pouco desconfiado com essa suposição, mas lendo sobre Cosmologia, achei-a mais razoável. Na minha aula de Filosofia da Religião, o professor utilizou-se desses conceitos para referir-se à falta de comunicação entre a Filosofia/Ciência e a Religião. Ele disse que o problema é que aquelas enxergam o mundo de forma isotrópica e esta de forma anisotrópica.

Em outras palavras, quando a Religião considera qualquer coisa sagrada, as instituições laicas não a reconhecem como tal. Essa idéia pode ser levada para os aniversários. Não consigo entender por que as pessoas consideram um determinado dia com tanta importância, em detrimento dos outros. Por que eu, por exemplo, deveria considerar de modo diferente um parabéns dado a mim no dia 13 de novembro — dia em que nasci — do dia 14 ou de qualquer outro dia, tendo-se por base que aquele dia é representativo e não exatamente o dia em que nasci?

Creio que uma visão isotrópica de mundo evitaria uma sucessão de caprichos humanos. Achei muito interessante o empréstimo de termos que o meu professor de Filosofia da Religião fez. Poderia desenvolver todo um pensamento a partir dessa distinção de visões de mundo. No fim das contas, entramos no âmbito da Hermenêutica. Já faz um tempo que quero tratar aqui sobre o assunto e dizer como tenho ficado deslumbrado com esse campo. Tudo acaba reduzindo-se à Hermenêutica e dedicarei uma futura postagem ao desenvolvimento dessa idéia.

Para terminar, se você está lendo esta postagem, já sabe que se me convidar para um aniversário no qual terei de pagar, não irei nem para cumprimentá-lo, pois minha gasolina não é água.

Um comentário:

  1. Ah, descobri porque você não foi ao meu aniversário. Se eu soubesse disso eu pagava o seu rodízio logo, menino fresco.
    Continua com esse papo de linha reta para você ver, hehehe.
    Nem lembrava que tu tinha blog!
    Respondi seu comentário lá!
    Abraço

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