Pintura de Raúl Berzosa em homenagem aos 80 anos do
Papa Francisco (1936-2025).
Em 2011, comecei a ser aluno do professor Olavo de Carvalho, de forma mais sistemática, embora já o acompanhasse no TrueOutspeak e em seus artigos, desde o ano anterior, e já tivesse conhecimento de quem ele era, por meio da extinta revista Primeira Leitura, que circulou entre 2003 e 2006. Por meio do professor de saudosa memória que conheci o Padre Paulo Ricardo e foi por meio de um dos seus vídeos que tomei consciência do tamanho da minha ignorância sobre o Catolicismo.
Como vocacionado à vida intelectual, era um grande admirador do Papa Bento XVI. Fui pego de surpresa quando a sua renúncia foi anunciada em 11 de fevereiro de 2013. Na época, já estava bastante avançado em meus estudos sobre a fé católica, mas não me sentia capaz de dar um passo adiante para abraçá-la. Pedi a Deus que me ajudasse a discernir o que Ele estava querendo com todas aquelas circunstâncias. Acompanhei, pela primeira vez, com grande apreensão, todas as especulações sobre quem eram os mais cotados para ser Papa. Não me recordo de ter visto o Cardeal Bergoglio em nenhuma dessas listas. Lembro-me de que todas as listas costumavam tratar a Igreja de forma não sobrenatural, reduzindo-a a disputas de poder entre progressistas e conservadores. Naquela época, eu me considerava um conservador. Tinha abandonado o libertarianismo, que abracei por anos, depois de muita leitura da Escola Austríaca em Economia. Pensava comigo que, caso determinado Cardeal fosse eleito, estaria provado que não deveria ser católico, julgando quem era merecedor do cargo por meio dos meus posicionamentos políticos. Hoje eu vejo como essa postura foi imatura e como eu ainda não compreendia como o Espírito Santo guia a Igreja.
O próprio Cristo escolheu os doze Apóstolos, mas isso não impediu que Judas Iscariotes o traísse e se suicidasse, que São Pedro o negasse publicamente, por três vezes, ou que apenas São João ficasse ao seu lado no Calvário. Creio firmemente hoje que o Espírito Santo dá a cada tempo precisamente o Papa de que precisa, mas não era a minha visão acompanhando o conclave de 2013 como um observador protestante.
No dia 13 de março de 2013, contrariando todas as especulações que acompanhara, o primeiro Papa latino-americano foi eleito. Ainda hoje, após mais de doze anos de catolicismo, não sei explicar muito bem com palavras como aquela experiência foi marcante em minha vida. Naquele dia, mandei a seguinte mensagem pra Dani, que hoje é minha esposa: "Amor, a partir de hoje, considero-me um católico. Estou cada vez mais apaixonado pela Igreja Católica. Foi uma das cenas mais bonitas que já vi quando o Papa pediu para o povo orar por ele e todas aquelas pessoas oraram. Só que não vou falar isso pra mais ninguém e não me sinto preparado para dizer para mais ninguém. Gostei da escolha. O Francisco I bateu de frente com a Kirchner na Argentina. Isso já é um bom sinal. Ele falou contra o casamento gay lá. É bom ele ser um latino porque traz novos ares à Igreja. Estou convencido de que Deus tem guiado a sua Igreja e que as portas do inferno não prevalecerão contra ela". Em resposta, ela me disse: "Esse Papa foi muito fofinho... Gracinha! Ele só não parece ser aqueeele intelectual, né?". A Dani sabia que eu admirava muito o Bento XVI, justamente pela sua envergadura intelectual. Percebam, contudo, como falávamos sobre a eleição do Papa de forma completamente mundana, sem nenhuma perspectiva sobrenatural.
O fato é que todos os meus estudos, desde 2011, fizeram todo o sentido no dia em que o Papa foi eleito. Minha conversão deu-se no dia em que o mundo soube que ele tinha sido escolhido o novo sucessor de São Pedro.
O estilo do Papa Francisco era bem diferente daquele de Bento XVI. Certa feita, vi um comentário do Padre Paulo Ricardo dizendo que cada fala do último caberia em uma encíclica, enquanto o primeiro era mais informal e freqüentemente dava munições à mídia para que suas palavras fossem usadas fora de contexto. O mesmo Padre afirmava que não era uma questão de que um estilo fosse superior ao outro: era apenas uma questão de escolher quais vantagens e desvantagens eram preferíveis pessoalmente na adoção de um estilo em detrimento ou favorecimento de outro.
Em 2013, eu passei a fazer parte de um coral que existia na paróquia São Pedro de Alcântara. O regente desse coral também regia o extinto Coro Filarmônico da Catedral Metropolitana de Brasília Nossa Senhora Aparecida. Lembro-me de uma senhora que também integrava os dois corais que dizia ser espírita. Ela passou a seguir-me no Facebook e acabamos ficando mais próximos a ponto de um dia eu ter liberdade para abordá-la sobre o Espiritismo. Para a minha surpresa, ela me confidenciou que o Papa Bento XVI tinha a afastado da Igreja, coisa que era inconcebível para mim, e que amava o Papa Francisco, que supostamente mudaria as coisas com respeito ao Espiritismo. Disse-lhe em vão que aquilo era impossível e que um Papa não tinha poder para operar tal coisa.
Naquele mesmo ano de 2013, eu enfrentei inúmeras confusões por conta da minha conversão. Lembro-me de que minha mãe, certa feita, disse-me: "Fábio, eu gosto muito desse Papa, mas eu nunca serei católica". O Papa mal tinha sido eleito, mas era impressionante como ele conseguia contagiar a todos com o seu carisma. As pessoas sentiam-se próximas a ele mesmo que não fossem católicas.
Em 2015, durante um almoço, minha mãe perguntou-me se eu tinha visto o que o Papa tinha dito sobre ter filhos. Diante da minha resposta negativa, sabendo o que eu pensava sobre a abertura à vida, ela falou que o Papa havia dito que não devemos nos reproduzir como coelhos. Imediatamente, eu tomei uma postura defensiva, disse que Papas podem falar bobagens, que a Infalibilidade Papal não abarca todo e qualquer pronunciamento papal. Assim que o almoço terminou, fui pesquisar o que o Papa dissera. Vi que não tinha dito absolutamente nada de mais e aprendi, pela primeira vez, a nunca confiar no que era noticiado sobre o Papa.
Com a passagem do tempo, os progressistas ficaram decepcionados com o Papa ao perceberem que era apenas mais um Papa perfeitamente ortodoxo em seus posicionamentos que não promoveria nenhuma revolução, e os conservadores rasgavam constantemente suas vestes a cada manifestação dele, por vezes, atrelando-lhe o epíteto de "comunista"!
Dias atrás, comentei, nos stories do meu perfil no Instagram, que não conseguia lembrar-me de nenhum desacordo que tivesse com o Papa Francisco, ao mesmo tempo em que conseguia mencionar alguns que tinha com Bento XVI. Imediatamente, houve quem me abordasse, por mensagem direta, citando as mesmas falas descontextualizadas de sempre. Disse que talvez o fato de que tenha sido sempre ovelha do Papa Francisco, mas nunca de Bento XVI, tivesse colaborado para que pensasse assim.
Aprendi a ser ovelha com o Papa Francisco: afinal, foi o primeiro Papa a quem me submeti depois da minha conversão. Não poderia deixar de mencionar como os textos do Carlos Ramalhete, especialmente um intitulado "¡HAGAN LÍO!", foram importantes para que aprendesse a ter uma perspectiva correta sobre o Papa, mas sobretudo foi importante acompanhar as fontes primárias, antes de ler qualquer opinião de terceiros – não posso deixar de mencionar os esforços do apologista Jimmy Akin em compilar todas as manifestações semanais do Papa por meio do seu "The Weekly Francis".
O Papa começou o seu pontificado publicando um documento que tinha sido escrito por Bento XVI, fazendo-lhe adendos, a encíclica "Lumen Fidei". Era a continuação de uma série de encíclicas que Bento XVI tinha publicado sobre as virtudes teologais. É importante destacar a sabedoria do Papa Francisco no modo como lidou, o tempo todo, com o fato de que o Papa anterior ainda estava vivo, lembrando que ele veio a falecer apenas em 2022.
A publicação da sua primeira encíclica realmente autoral deu-se em 2015. Lembro-me de como o meio conservador torceu o nariz para esse documento, ignorando o que um dos principais filósofos conservadores explicou sobre a chamada "Filosofia Verde". Aprendi com o Papa Francisco que não há temáticas proibidas para o Catolicismo e que ser católico é sê-lo em todos os âmbitos da nossa vida, incluindo o modo como nós nos relacionamos com o meio ambiente. Durante muitos anos, fui aterrorizado pela Teologia da Libertação, por influência daqueles católicos que acompanhava. Quando escutava a palavra "pobre" proferida por um Padre, logo pensava comigo que ouviria besteiras em seguida. Foi com o Papa que aprendi que os cristãos lidam com pobres muito antes de qualquer ideologia moderna.
Em 2016, o Papa lançou um livro chamado "O nome de Deus é misericórdia". Na época, comentei com o meu diretor espiritual que fiquei bastante surpreso com o conteúdo, pois não tinha encontrado nele nada de heterodoxo – nessa época, eu ainda me esforçava sem sucesso para encontrar o Papa herético apregoado por certos círculos conservadores. Em verdade, o Papa "comunista" que freqüentemente era atacado por esses meios nunca existiu para mim: eu acompanhava o que o Papa dizia e escrevia em primeira mão, muito antes de ter contato com tablóides midiáticos. Há um episódio nesse livro que me marcou de forma muito profunda. O Papa explica que estava tentando convencer um homem a confessar-se, mas que ele dizia não estar arrependido. O Papa perguntou-lhe se ele desejava estar arrependido. Diante de sua resposta positiva, deu-lhe a absolvição.
A publicação da sua primeira encíclica realmente autoral deu-se em 2015. Lembro-me de como o meio conservador torceu o nariz para esse documento, ignorando o que um dos principais filósofos conservadores explicou sobre a chamada "Filosofia Verde". Aprendi com o Papa Francisco que não há temáticas proibidas para o Catolicismo e que ser católico é sê-lo em todos os âmbitos da nossa vida, incluindo o modo como nós nos relacionamos com o meio ambiente. Durante muitos anos, fui aterrorizado pela Teologia da Libertação, por influência daqueles católicos que acompanhava. Quando escutava a palavra "pobre" proferida por um Padre, logo pensava comigo que ouviria besteiras em seguida. Foi com o Papa que aprendi que os cristãos lidam com pobres muito antes de qualquer ideologia moderna.
Em 2016, o Papa lançou um livro chamado "O nome de Deus é misericórdia". Na época, comentei com o meu diretor espiritual que fiquei bastante surpreso com o conteúdo, pois não tinha encontrado nele nada de heterodoxo – nessa época, eu ainda me esforçava sem sucesso para encontrar o Papa herético apregoado por certos círculos conservadores. Em verdade, o Papa "comunista" que freqüentemente era atacado por esses meios nunca existiu para mim: eu acompanhava o que o Papa dizia e escrevia em primeira mão, muito antes de ter contato com tablóides midiáticos. Há um episódio nesse livro que me marcou de forma muito profunda. O Papa explica que estava tentando convencer um homem a confessar-se, mas que ele dizia não estar arrependido. O Papa perguntou-lhe se ele desejava estar arrependido. Diante de sua resposta positiva, deu-lhe a absolvição.
A temática da misericórdia de Deus foi onipresente em todo o seu pontificado. Esse episódio relatado pelo Papa lembra o modo como o pai recebe o seu filho na Parábola do Filho Pródigo. Deus, de uma forma incompreensível, aceita qualquer fagulha de arrependimento. O filho não retornou para a casa do pai por ter consciência do seu erro, por ter notado que ofendeu o seu pai, duramente, ao tomá-lo por morto antes do tempo, pedindo-lhe sua herança, mas apenas porque não queria mais comer comida de porco. O pai, no entanto, nem espera o filho falar direito, corre ao seu encontro, abraça-o fortemente, promove uma festa pelo fato do seu filho ter retornado, mesmo pelas razões não lá muito corretas. Eu ensino aos meus alunos catecúmenos a distinção entre a contrição perfeita e a imperfeita apelando a essa Parábola e citando esse relato do Papa em seu livro.
O meu documento favorito do Papa, no entanto, não é uma encíclica, mas uma exortação apostólica. Ainda hoje, eu medito sobre o conteúdo da maravilhosa "Gaudete et exsultate", que disserta sobre a chamada à santidade no mundo atual. Se nunca o leu, recomendo-o fortemente. Esse texto fez-me desconfiar de que o Papa talvez fosse Santo. Sete anos depois de sua publicação, acompanhando suas catequeses, em suas audiências, lendo as biografias que escreveu e acompanhando o modo como se comportou, ao exercer sua dura função de Papa, tenho certeza de que foi um homem de Deus que viveu radicalmente a sua fé, de uma forma muito bonita e exemplar. É comovente que tenha se esforçado tanto para estar próximo do povo de Deus um dia antes do seu falecimento.
Enfim, eu realmente aprendi tanta coisa com o Papa que fica difícil escrever um texto que não se torne um livro. Foi um Papa que amei profundamente, que marcou minha própria história, mas que sobretudo me ensinou, como já disse, a ser ovelha.
Não faço idéia de quem será o próximo Papa, mas procurarei escutá-lo docilmente da mesma forma com que procurei ser ouvinte de Francisco. É importantíssimo que realmente estejamos unidos ao Magistério da Igreja de mente e de coração. Quando um Papa publica um documento, como católicos, não temos de ficar querendo corrigi-lo ou julgá-lo, mas perguntar-nos o que Deus deseja falar conosco por meio daquelas palavras.
O Papa Francisco foi um Papa que buscou acolher a todos, que levou a pastoralidade aos seus limites a fim de que nenhum pecador não se sentisse amado por Deus. Foi um grande Papa, que promoveu reformas importantes, sem nunca afrontar o Depósito da Fé, que conservou e transmitiu, de forma muito digna, de modo que poderia perfeitamente dizer, como São Paulo, que combateu um bom combate, terminou sua carreira e guardou a fé (2 Tm. 4.7).
Viva Francisco! Que Deus o recompense por toda a sua completa doação à Santa Igreja.