domingo, 22 de novembro de 2009

Sobre a Homossexualidade



Fiquei um tempo sem atualizar o Blog porque tinha um assunto específico que queria abordar, mas não o desenvolvi de forma que me agradasse para colocá-lo aqui; então, não consegui comentar sobre outros assuntos. Surgiram, contudo, vários outros assuntos que suscitaram minha reflexão. Já faz um tempo que tenho pensado acerca da homossexualidade. Minhas meditações tiveram por ponto de partida um contexto teológico. Aviso, com antecedência, que meu texto tem por objetivo muito mais a reflexão aberta do que um fechamento sobre o assunto.

No ano de 2001, quando fiz a minha primeira leitura crítica da Bíblia — utilizando o método da dúvida cartesiano —, cheguei à conclusão de que ela não poderia ser a palavra literal de Deus; no máximo, o melhor guia que temos em mão. Quanto mais aprimoro meus estudos relacionados à Lingüística, mais vejo que se Deus quisesse criar algo como um manual, não teria escrito um livro como a Bíblia, mas isso é discussão para outra postagem.

A maior parte das informações que utilizarei faz parte de uma edição da revista “Mente e Cérebro”, Ano XV, nº 185, intitulada “As novas sexualidades”. Certa vez, discutindo sobre o assunto, algumas pessoas utilizavam o termo “homossexualidade” e outras “homossexualismo”. Indaguei-me, então, se haveria diferença no emprego dos dois termos. Descobri a solução na referida edição da “Mente e Cérebro”. O termo “homossexualismo” era utilizado até 1985 pela CID — Classificação Internacional de Doenças —, publicação da Organização Mundial da Saúde — OMS —, na qual aparecia na categoria de distúrbio mental. O sufixo “ismo”, gramaticalmente, não designa, necessariamente, doenças, como se vê em “Cubismo”, por exemplo; no entanto, grupos gays têm interpretado tal termo como pejorativo. O termo “homossexualidade” é tido como menos discriminatório portanto. Teóricos, juristas, entre outros estudiosos, sugerem o uso de outros termos, como relações homoafetivas ou homoeróticas, no intuito de utilizarem termos neutros. Utilizarei todos os termos sem conotações quaisquer.

Hoje, com o politicamente correto em voga, qualquer opinião torna-se preconceituosa. Se um cristão diz ser contrário ao homossexualismo, é tido por preconceituoso. Admito que a grande maioria nunca estudou o assunto e apenas parte da leitura bíblica para ter uma posição, mas as pessoas têm o direito de tomarem partido sobre qualquer assunto sem serem tidas por preconceituosas, desde que tenham informação e tenham refletido suficientemente sobre tal assunto.

Acredito que ninguém que já tenha lido a Bíblia dirá, em sã consciência, que ela não é contrária às relações homossexuais. Não me aprofundarei no assunto, mas citarei algumas passagens bem esclarecedoras:

“Não se deite com um homem como quem se deita com uma mulher; é repugnante”.
[ Levítico 18.22]

“Se um homem se deitar com outro homem como quem se deita com uma mulher, ambos praticaram um ato repugnante. Terão que ser executados, pois merecem a morte”
[ Levítico 20.13 ]

“Da mesma forma, os homens também abandonaram as relações naturais com mulheres e se inflamaram de paixão uns pelos outros. Começaram a cometer atos indecentes, homens com homens, e receberam em si mesmos o castigo merecido pela sua perversão” [ Romanos 1.27 ]

“Vocês não sabem que os perversos não herdarão o Reino de Deus? Não se deixem enganar: nem imorais, nem idólatras, nem adúlteros, nem homossexuais passivos ou ativos”
[ 1 Coríntios 6.9 ]

A Bíblia foi escrita por homens — fazem questão de dizer “inspirados por Deus”, mas acredito que essa ênfase não passa de um jogo de linguagem, embora acredite que eles, de fato, foram inspirados por Deus — e não o foi de modo psicografado, como era feito pelo Chico Xavier, por exemplo. A escrita deles, portanto, tem influência da cultura em que eles estavam inseridos. A não ser que você acredite que os autores da Bíblia escreveram-na de modo psicografado, não creio que alguém possa questionar que ela possui influências culturais. Conversando com um pastor que admite isso, perguntei como eles podem saber que conselho ou que prática recomendada é divina ou um traço cultural e perguntei, especificamente, sobre o homossexualismo. Foi-me respondido que a homossexualidade é um assunto que tem a mesma abordagem em todo o texto bíblico; então, tem-se um pensamento definitivo sobre o assunto. A questão é: não existe a possibilidade de um preconceito perpetuar por um tempo maior do que o contemplado pela Bíblia? Vários preconceitos só começaram a ser eliminados no século XX com o advento de movimentos ou da própria tecnologia, no sentido do entendimento de doenças por exemplo.

Por meio do filme Kinsey — Vamos falar de sexo, conheci o trabalho do Alfred Kinsey. Tenho enorme vontade de ler os dois principais livros dele sobre sexualidade: “Sexual Behavior in the Human Male” e “Sexual Behavior in the Human Female”. São obras extensas: cada uma excede oitocentas páginas. Kinsey fez uma classificação da sexualidade humana e divulgou estatísticas sobre relacionamentos homossexuais, que até então não eram conhecidas. Kinsey era bissexual. Ele procurou não divulgar isso para não interpretarem sua pesquisa de maneira errada, mas após sua morte, sua esposa contou sobre a opção sexual de seu esposo e muitos interpretaram-no como farsante. Não vejo nenhum problema nisso; inclusive, praticamente todos os pesquisadores do assunto tem sexualidade, digamos, não convencional. Quem faz a apologia cristã é o cristão e não o ateu! A filósofa Judith Butler tem questionado a divisão entre macho e fêmea, masculino e feminino. Ela lançou um livro intitulado “Problemas de Gênero” que ainda não li, mas que quero ler para entender melhor o assunto. Para ela, gênero é um ato, uma ação pública, a encenação de significações já estabelecidas socialmente. Como explicar, por exemplo, o caso da ex-prefeita de Cambridge Jenny Bailey que após cirurgia de redefinição de sexo, tornando-se mulher, escolheu ter como objeto de amor alguém do mesmo sexo, ou seja, outra mulher?

A teoria da psicanálise freudiana pode ser tida como uma teoria sobre a aquisição do gênero masculino ou do feminino. Freud já abordava o desenvolvimento da sexualidade. Robert Stoller, na década de 60, estudou crianças do sexo masculino que tinham identificação com o feminino. Quando brincavam, agiam como se fossem meninas, assumindo papéis femininos. Stoller tratava tais casos como patológicos. É fato que existem casos de não-coerência entre sexo anatômico e gênero. A sociedade exige que haja coerência entre anatomia, identidade de gênero, desejo e prática sexual.

Para os detratores de plantão do Evolucionismo, a bióloga, professora e pesquisadora, de Stanford, Joan Roughgarden[1] contesta a Teoria da Seleção Sexual de Darwin. Ela diz que “se uma teoria diz que algo está errado com tantas pessoas em tantas culturas e épocas diferentes, então, talvez, o erro esteja na teoria — e não nas pessoas”. Os exemplos clássicos do pavão e do cervo, este com relação à sua galhada e aquele com relação à ornamentação de sua cauda, são contrapostos pela jaçanã, cujas fêmeas são fortemente ornamentadas e cujos machos são insípidos e sem graça, invertendo a lógica portanto.

Muitos animais, inclusive, nem sequer são nitidamente classificados em dois sexos. Nos recifes de corais, cerca de um terço dos peixes produzem óvulos e esperma, alguns ao mesmo tempo e outros em épocas diferentes ao longo da vida. Eles são chamados, respectivamente, de hermafroditas simultâneos ou seqüenciais e diz-se que eles “trocam de sexo”. O mais comum entre organismos multicelulares, inclusive plantas, é um mesmo indivíduo produzir tanto gametas masculinos quanto femininos em algum momento da vida. Portanto, a classificação, sem ambigüidade, como macho ou fêmea não deveria ser norma.

O escritor Bruce Bagemihl[2] catalogou mais de 300 espécies de vertebrados nas quais o contato genital entre indivíduos do mesmo sexo ocorre regularmente. Em algumas dessas espécies, a homossexualidade não é muito comum — de 1% a 10% de todos os casais. Em outros casos, como no dos chimpanzés bonobos, o acasalamento homossexual ocorre com a mesma freqüência que o heterossexual. Com relação ao tempo da duração, algumas espécies têm uniões esporádicas e outras duradouras.

Não tenho dúvidas de que o homossexualismo é resultado da genética, embora saiba que o meio contribui, e muito, para o desenvolvimento de comportamentos que têm predisposições genéticas. Não entrarei nesse mérito; contudo, não entendo o motivo dos homossexuais levantarem a bandeira da homossexualidade congênita: e se ele escolher ser homossexual? E daí? Acredito que eles deveriam defender sua causa a partir de um contexto da liberdade[3].

Agora, irei expor o meu questionamento em si. Se é fato que as relações homossexuais são comuns na natureza, por que Deus reprovaria tal ato nos homens se o comportamento animal foi criado pelo próprio Deus? Conversando com um primo meu sobre essa minha argumentação, ele disse que Deus não teria motivo para estabelecer o mesmo padrão moral entre os homens e os animais; contudo, utilizar-me-ei de um texto do livro de Gênesis para mostrar que existe tão padrão moral:

“A todo aquele que derramar sangue, tanto homem como animal, pedirei contas; a cada um pedirei contas da vida do seu próximo” [ Gênesis 9.5 ]

Ora, talvez, possam argumentar que o “tanto homem como animal” refere-se ao ato do homem matar outro homem ou outro animal e não a um homem matar alguém ou um animal matar alguém. Ainda não sei Hebraico de modo satisfatório para analisar o texto original; no entanto, utilizarei outra passagem que esclarecerá que a minha interpretação faz sentido:

“Se um boi chifrar um homem ou uma mulher, causando-lhe morte, o boi terá que ser apedrejado até a morte, e a sua carne não poderá ser comida. Mas o dono do boi será absolvido”
[ Êxodo 21.28 ]

Acredito que a passagem acima mostra que o texto de Gênesis prova que Deus mantém um paralelo entre o comportamento moral dos animais e o dos homens — na verdade, o texto de Êxodo bastaria. Se Deus incutiu nos organismos o homossexualismo, por que os repreenderia por isso? Sei que o meu questionamento abre margem para a discussão acerca da existência de volição de fato em outros seres além da espécie humana; no entanto, a partir da perspectiva bíblica de que apenas nós fomos feitos à imagem e semelhança de Deus, acredito que a nossa capacidade de julgamento e de raciocínio é o que nos diferencia dos outros seres e aproxima-nos de Deus. Partindo-se desse pressuposto, qual seria a explicação para abominar um determinado ato se ele é tão comum na natureza? Poder-se-ia argumentar que a nossa capacidade de raciocínio serve para, justamente, afastar-nos de tal natureza corrompida; no entanto, acredito que, no que se refere ao comportamento dos organismos, não seria muito lógico Deus ordenar seres inocentes agirem de um modo extremamente "repugnante", segundo os trechos que citei. Podem também argumentar que a lógica divina não é a mesma que a nossa, mas adentrar nesse tipo de caminho, para mim, é preguiça intelectual. Seria como dizer: "já que Deus é infinitamente superior a nós e somos incapazes de entendê-lo completamente, vamos deixar pra lá.". Citarei um versículo para exterminar esse tipo de pensamento:

"As coisas encobertas pertencem ao Senhor, o nosso Deus, mas as reveladas pertencem a nós e aos nossos filhos para sempre, para que sigamos todas as palavras desta lei"
[ Deuteronômio 29.29 ]

Sei que podem utilizar o versículo acima para contestarem minha visão sobre a Bíblia, na medida em que se diz que devemos seguir todas as "palavras desta lei", mas quero enfatizar neste versículo que as coisas reveladas incluem a própria criação. É importante, outrossim, frisar que Deus revela-se na natureza — os teólogos denominam tal tipo de revelação como Geral. Essa é uma verdade bíblica. Posso citar algumas passagens:

“Os céus declaram a glória de Deus; o firmamento proclama a obra das suas mãos.”
[ Salmos 19.1]

“Pois desde a criação do mundo, os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis” [ Romanos 1.20]

O texto acima de Romanos é bem contundente: compreendemos Deus por meio das coisas criadas. Observar a natureza e compreendê-la é compreender o próprio Deus. Não estou divulgando nenhuma forma de panteísmo. Deus está acima de sua criação. Mais do que julgar o comportamento homossexual como correto ou não, devemos amar e respeitar o homossexual como a qualquer ser humano.


[1] Evolução do gênero e da sexualidade. Joan Roughgarden. Ed. Planta, 2004
[2] Biological exuberance: animal homossexuality and natural diversity, Bruce Bagemihl. St. Martin's Press, 2000
[3] Não Pode @ HOMOSSEXUAL Ser LIVRE?
http://www.xr.pro.br/ENSAIOS/Homossexualismo.HTML

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Que é a Teologia?

Meus dias de postagem neste blog são nos sábados, mas como estive ausente nos dois últimos, resolvi abrir uma exceção nesta semana. Teve, recentemente, uma controvérsia no Twitter sobre o que seria a Teologia. Acredito que é importante delinear as fronteiras de todo campo de estudo. A maioria das matérias costumam, em seus livros introdutórios, definir, mesmo que seja de modo não definitivo, o que é que se propõe a estudar. Eu não cheguei a dar uma definição, mas alguém chegou a dizer que a Teologia não é o estudo sobre Deus, mas sob Deus. É bem diferente definir o que é algo e como se quer que esse algo seja. A palavra Teologia surge da aglutinação de duas palavras gregas: θεóς (theos) e λóγος (logos). A primeira, como se sabe, significa Deus. A segunda costuma ser traduzida por "razão" ou "estudo"; no entanto, consultando o meu dicionário de Grego do Isidro Pereira, vi que as acepções são muitas: "palavra", "dito", "revelação divina", "resposta dum oráculo", "máxima", "sentença", "exemplo", "decisão", "resolução", "condição", "promessas", "pretexto", "argumento", "ordem" e por aí vai. Algumas acepções, inclusive, não se parecem adequar muito com o significado de razão costumamente atribuído à palavra grega.

Fazendo um paralelo da palavra "Teologia" com "Biologia" ou mesmo "Filosofia", não há porque não atribuir-se uma definição de estudo de Deus ou sobre Deus, sendo que o uso da preposição "de" gera a ambigüidade — talvez, satisfatória para alguns, mas tendenciosa para outros — de um estudo que provém de Deus em vez de tentar abarcá-lo. É importante estudar um pouco a etimologia histórica da palavra "Teologia". Ela aparece pela primeira vez na República de Platão, sendo que a palavra "logos" possui toda uma carga semântica depois de sua apropriação por parte de Heráclito, já que ela passa a contrapor-se a um contexto mitológico freqüente no período micênico e dórico e que ainda tem certo predomínio no período arcaico. A palavra "logos", portanto, opondo-se ao mito, possui todo um contexto que deve ser considerado quando se quer dizer o que é a Teologia.

Lendo a Teologia Sistemática de Paul Tillich, contudo, encontrei um texto interessante sobre o assunto que me fez ver que a coisa não é tão simples como imaginava. As pessoas não partem de uma análise etimológica e histórica para conceituar campos de estudos. O texto faz uma distinção entre Teologia e Filosofia da Religião e, posteriormente, distingue um ramo que poderia chamar-se Teologia Científica. Resolvi colocá-lo aqui. Partindo da minha leitura do texto transcrito, não acredito que seja necessária uma concordância por parte do teólogo com relação ao seu objeto de estudo. Obviamente, quando se ama o que se estuda, há maior envolvimento, mas eu mesmo já tive a experiência de ter de estudar teorias com as quais não concordava. Não vejo, portanto, impedimento para que existam teólogos ateus, por exemplo, dentro da minha definição etimológica. O Paul Tillich, contudo, define a Teologia por meio de um artifício chamado "círculo teológico". Achei muito interessante o corte que ele construiu a partir dessa conceituação.

O Círculo Teológico

Tentativas de elaborar uma teologia como uma "ciência" empírico-indutiva ou metáfico-dedutiva, ou como uma combinação de ambas, evidenciaram amplamente que não conseguem ter êxito. Em toda teologia pretensamente científica, há um ponto em que a experiência individual, a valoração tradicional e o compromisso pessoal exercem um papel decisivo. Tal ponto, muitas vezes ignorado pelos autores de tais teologias, é óbvio para os que olham para elas com outras experiências e outros compromissos. Se empregarmos uma abordagem indutiva, devemos perguntar pela direção em que o escritor busca seu material. E se a resposta for que ele olha em qualquer direção e para qualquer experiência, devemos perguntar: que característica da realidade ou da experiência é a base empírica de sua teologia? Qualquer que seja a resposta, está implícito um a priori de experiência e valoração. O mesmo ocorre quando o método empregado é o dedutivo, como no idealismo clássico. Os princípios últimos da teologia idealista são expressões racionais de uma preocupação última; como todas as ultimidades metafísicas, tais princípios são, ao mesmo tempo, ultimidades religiosas. Uma teologia daí derivada se encontra determinada pela teologia oculta implícita neles.
Em ambas as abordagens, a empírica e a metafísica, bem como nos inúmeros casos que combinam as duas, podemos observar que o a priori que dirige a indução e a dedução é um tipo de experiência mística. Seja ele o "ser-em-si" (escolástica) ou a "substância universal" (Spinoza), seja o "além da subjetividade e objetividade" (James) ou a "identidade de espírito e natureza" (Schelling), seja o "universo" (Schleiermacher) ou a "totalidade cósmica" (Hocking), seja o "processo criador de valor" (Whitehead) ou a "integração progressiva" (Wieman), seja o "espírito absoluto" (Hegel) ou a "pessoa cósmica" (Brightman) — cada um desses conceitos está baseado em uma experiência imediata de um valor ou ser último, do qual podemos chegar a ser conscientes intuitivamente. Idealismo e naturalismo, quando desenvolvem conceitos teológicos, diferem muito pouco em seu ponto de partida. Ambos dependem de um ponto de identidade entre o sujeito que vive a experiência e o elemento de caráter último que aparece na experiência religiosa ou na experiência do mundo como "religioso". Os conceitos teológicos, tanto dos idealistas quanto dos naturalistas, estão enraizados em um "a priori místico", uma consciência de algo que transcende a separação entre sujeito e objeto. E se, no curso de um processo "científico", descobrimos tal a priori, isto só é possível porque ele já estava presente desde o começo. Esse é o círculo do qual nenhum filósofo religioso pode escapar. E de modo algum ele é vicioso. Toda compreensão no âmbito do espírito (Geisteswissenschaft) é circular.
Mas o círculo em que atua o teólogo é mais estreito do que o do filósofo da religião. Ele acrescenta ao "a priori místico" o critério da mensagem cristã. Enquanto o filósofo da religião tenta permanecer geral e abstrato em seus conceitos, como o próprio termo "religião" indica, o teólogo é, consciente e intencionalmente, específico e concreto. A diferença naturalmente não é absoluta. Já que a a base experimental de toda filosofia da religião está parcialmente determinada pela tradição cultural à qual pertence — mesmo o misticismo está culturalmente condicionado — ela inevitavelmente inclui elementos concretos e específicos. Mas o filósofo, enquanto filósofo, tenta abstrair desses elementos e criar conceitos acerca da religião que tenham validade geral. O teólogo, por seu turno, propõe a validez universal da mensagem cristã, apesar de seu caráter concreto e específico. Ele não justifica esta reivindicação abstraindo da concretude da mensagem, mas acentuando sua unidade irrepetível. Ele entra no círculo teológico com um compromisso concreto. Entra nele como membro da igreja cristã para cumprir uma das funções essenciais da igreja: sua auto-interpretação teológica.
O teólogo "científico" quer ser mais do que um filósofo da religião. Ele quer interpretar a mensagem cristã de uma forma geral com o auxílio de seu método. Isto o coloca diante de duas alternativas. Ele pode incluir a mensagem cristã em seu conceito de religião, e então o cristianismo é considerado como um exemplo de vida religiosa, ao lado de outros. Certamente é a religião mais alta, mas não é a final nem a única. Esta teologia não entra no círculo teológico. Ela permanece dentro do círculo religioso-filosófico e de seus horizontes indefinidos — horizontes que se abrem para um futuro de novas e talvez mais elevadas formas de religião. O teólogo científico, apesar de seu desejo de ser teólogo, permanece um filósofo da religião. Ou ele se torna realmente um teólogo, um intérprete de sua igreja e de sua reivindicação à unicidade e validez universal. Neste caso, ele entra no círculo teológico e deveria admitir que o fez e parar de falar de si mesmo como um teólogo "científico" no sentido corrente do termo.
Mas inclusive o ser humano que ingressou consciente e abertamente no círculo teológico enfrenta outro problema sério. Para estar dentro do círculo, ele deve ter tomado uma decisão existencial. Deve estar na situação de fé. Mas ninguém pode dizer de si mesmo que está na situação de fé. Ninguém pode chamar a si mesmo de teólogo, mesmo que tenha sido chamado a ser professor de teologia. Todo teólogo está comprometido e alienado. Ele está sempre na fé e na dúvida; está dentro e fora do círculo teológico. Às vezes um lado prevalece, às vezes o outro, e ele jamais tem certeza sobre qual dos lados prevalece efetivamente. Portanto, só é possível aplicar um critério: alguém só pode ser teólogo na medida em que reconhecer o conteúdo do círculo teólogico como sua preocupação última. A verdade disso não depende de seu estado intelectual, moral ou emocional. Não depende da intensidade e da certeza da fé. Não depende do poder de regeneração ou do grau de santificação. Antes, depende de que ele se sinta preocupado de forma última com a mensagem cristã, ainda que, à vezes, esteja inclinado a atacá-la e rejeitá-la.
Essa compreensão da "existência teológica" resolve o conflito entre os teólogos ortodoxos e pietistas sobre a theologia irregenitorum ("teologia dos não-regenerados"). Os pietistas sabiam que não se pode ser teólogo sem fé, sem decisão, sem compromisso, sem estar no círculo teológico. Mas identificavam a existência teológica com uma experiência da regeneração. Os ortodoxos protestaram contra isso, argumentando que ninguém pode estar certo de sua regeneração e que, além disso, a teologia lida com materiais objetivos que podem ser manuseados por qualquer pensador, dentro e fora do círculo teológico, desde que satisfaça as condições intelectuais requeridas. Hoje, os teólogos ortodoxos e pietistas se acham aliados contra os teólogos críticos, supostamente descrentes, ao passo que a herança do objetivismo ortodoxo foi assumida pelo programa (não pelas realizações) da teologia empírica. Diante dessa antiga controvérsia, devemos reafirmar que o teólogo deve estar dentro do círculo teológico, mas o critério para determinar se está dentro dele é a aceitação da mensagem cristã como sua preocupação última.
A doutrina do círculo teológico tem uma conseqüência metodológica: nem a introdução nem qualquer outra parte do sistema teológico constitui a base lógica para as outras partes. Cada parte é dependente das outras. A introdução pressupõe a cristologia e a doutrina da igreja, e vice-versa. A distribuição temática depende tão-somente de considerações práticas.

sábado, 10 de outubro de 2009

20 passos para um relacionamento saudável

A postagem de hoje tem por inspiração os textos que o Artur da Távola — falecido em maio do ano passado — escrevia sobre o amor. Uma breve pesquisa no Google já fornece vários dos excelentes textos dele. Não gosto de textos de autoajuda e acredito que aqueles que privilegiam esse tipo de leitura são preguiçosos para construírem um saber filosófico consistente, já que todos os temas abordados por escritores de autoajuda podem ser encontrados em textos de filósofos geniais.

Dois textos que acredito que são fundamentais para o entendimento do amor são o belíssimo soneto de Camões "Amor é fogo que arde sem se ver" e o texto bíblico de Coríntios 13. A abordagem dos dois textos, contudo, refere-se a esferas distintas: enquanto Camões disserta sobre um amor sentimental, Paulo refere-se a um amor platônico, na medida em que ele trata de um amor no qual devemos espelhar-nos. Seria, mais ou menos, como a distinção que se costuma fazer, no campo da Ética, entre moral e ética, esta representando como a moral deve ser e aquela representando como se dão ou deram-se as relações morais no decorrer do tempo.

Pensei também em escrever um texto a partir da abordagem do mito de Eros e Psiquê, destrinchando algumas particularidades que enxergo, de uma genealogia bíblica, tratando os diversos contextos em que o amor aparece no texto bíblico, ou a partir de uma perspectiva filosófica, já que toda filosofia parte do amor ao conhecimento. Optei, no entanto, por fazer uma enumeração de conselhos ou observações que tenho feito ao longo dos meus relacionamentos e tendo-se por base os relacionamentos de pessoas próximas a mim. É claro que a lista não é fechada: provavelmente, acrescentarei muita coisa a ela no decorrer da minha vida, mas acho que vale a pena tentar fazer esse tipo de trabalho e disponibilizá-lo no meu blogue. Enfim, eis a lista:

1) Não inicie um relacionamento sem o vislumbramento de um futuro com o seu parceiro.

Se você está apenas a fim de um "peguete" fixo ou coisa do gênero, não inicie um namoro. As pessoas costumam discordar sobre qual é o significado de um namoro. Várias delas interpretam-no como uma espécie de "test-drive" no qual quanto mais carros você experimentar melhor. O meu conselho é: não façam isso! Pessoas não são carros! Além de você poder magoar profundamente alguém, você pode perder a oportunidade de construir uma vida ao lado de quem realmente deveria ser o seu parceiro. Sei que hoje existem pessoas que não são adeptas da monogamia e que acham que esse papo de alma gêmea e afins é um assunto ultrapassado, mas posso dizer que o que tenho visto nos relacionamentos felizes e sadios confirma o que tem sido chamado de conservadorismo. Para resumir, se você não se vê com aquela pessoa daqui a dez anos, nem comece um relacionamento.

2) Busque relacionar-se com pessoas que se assemelham a você.

Este item pode gerar controvérsias num primeiro momento, mas acho que, com a minha explicação, ele se tornará mais claro. O papo de que "opostos se atraem" só funciona na Física, e mesmo assim só por uma questão de convenção. Quanto menos divergências, mais fácil será o namoro. Não excluo o fato de que o amor verdadeiro pode tudo superar, e não só pode, mas supera; contudo, procurar pessoas que compartilhem das suas crenças e convicções evita muita dor de cabeça. Esse é um conselho que minha mãe sempre me deu e concordo inteiramente com ela. O próximo item irá mostrar que seguir este já facilita as coisas, já que as diferenças são inevitáveis.

3) Saiba que as diferenças são as regras, e não as exceções.

Homens e mulheres são diferentes por natureza em todos os âmbitos: psicológicos, fisiológicos, sociológicos etc. . As diferenças já começam no fato de vocês serem de sexos distintos — espero que nenhum homossexual surja aqui dizendo que os deixei de lado. Não é à toa que dizem que os homens são de Marte e as mulheres, de Vênus. Se quem foi criado com você, seus irmãos, já são completamente diferentes de você, imagine quem foi criado em condições totalmente diferentes! As diferenças certamente surgirão e não se espante com elas, mas saiba enfrentá-las e persista no amor que você sente.

4) Seja moldável sem se descaracterizar.

É importante saber ceder num relacionamento. Não existe isso de você querer que alguém ame você do jeito que você é e pronto. Se, na pior das hipóteses, você e o seu parceiro divergirem em tudo, resta a possibilidade de vocês cederem em certos pontos, não significando que vocês, simplesmente, não nasceram um pro outro. Há, no entanto, uma tênue linha que deve ser mantida e respeitada: ao mesmo tempo em que você deve aprender a ceder, você não deve descaracterizar-se completamente, esvaziar-se de si mesmo e deixar de ser quem você é, perdendo a sua identidade. Saber respeitar isso é extremamente complicado e só o tempo fornece a experiência necessária para saber fazer a distinção correta. Você estará no ponto certo quando você puder dizer: "eu sou outra pessoa com você: alguém mais parecido comigo mesmo".

5) Não deixe que o caráter passional do amor defina-o, mas torne-o uma decisão tomada no dia a dia.

Em outras palavras, existe uma diferença fundamental entre paixão e amor. As próprias definições nos dicionários confundem as palavras, mas até a Ciência já mostrou estatisticamente que a paixão dura, em média, pouco mais de um ano [1], embora também já tenha mostrado que é possível prolongá-la [2]. Ainda me questiono se os nossos sentimentos são apenas ação de substâncias bioquímicas ou algo mais. Acho que esse algo mais está na nossa capacidade de decisão. Nada contra a paixão; inclusive, se houver paixão no amor, melhor ainda, mas ela não deve definir o amor que se sente ou ser base dele. Trataria o amor como hiperônimo da paixão, pois o amor pode abrangê-la, mas a paixão pode existir sem o amor. Se você está tendo um relacionamento com alguém, decida amar essa pessoa a cada dia que você acordar: se o amor for uma decisão, ele será capaz de sustentar o seu relacionamento, independentemente de como esteja o nível da sua paixão.

6) Privilegie o papel do diálogo no seu relacionamento.

Busque essa interação na sua relação tendo em vista que você tem dois ouvidos e apenas uma boca. Estejam prontos para ouvir e sejam tardios para falar [3] e, quando forem falar, tenham em mente que a boca fala daquilo que o coração está cheio [4]; portanto, se o seu coração está cheio de amor, você irá sempre falar palavras de amor ao seu parceiro. Evite termos sinônimos de grosseria ou que sejam chulos. Tente sempre manter o nível do diálogo com palavras saudáveis. O diálogo abre espaço para discussão de idéias e dá oportunidade para que você conheça melhor o outro; da mesma maneira, é por meio do diálogo que você descobrirá, com antecedência, como vocês administrarão um lar, educarão os filhos e se existem grandes dissonâncias na maneira de vocês encararem a vida e os seus percalços.

7) Relacionamentos demandam tempo.

O belo texto de Eclesiastes 3 afirma que "há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu". Não há como manter um relacionamento se você não dispensar tempo de investimento nele. Acredito que este item serve de pressuposto para os outros itens porque não há como dialogar, conhecer, amar sem dedicar tempo para isso. Se você deseja ter um relacionamento saudável, é indispensável que você reserve o tempo necessário para tanto.

8) Tenha o amor por ideologia.

Respeite o amor como se fosse algo que não pertence só a você, como se fosse um nome de família que você leva e que, se você desonrá-lo, estará desonrando várias pessoas se não tomar os cuidados devidos. Seja engajado no que se refere ao amor, lute por ele, o preserve!

9) Tenha empatia pelo seu parceiro.

Ter empatia é a capacidade de colocar-se no lugar do outro. Uma pergunta fundamental que deve ser feita no seu modo de agir é: "Eu gostaria se ele/ela fizesse isso comigo?". Quando você age pensando dessa forma, as coisas ficam mais simples.

10) Não deixe o seu relacionamento cair no marasmo.

O item 5 evita, de certa forma, que o seu relacionamento não definhe por causa do marasmo, mas convenhamos que um namoro torna-se muito mais saudável quando ainda se tem romantismo, surpresa. Não fique preso às datas comemorativas e especiais, mas saiba surpreender o seu parceiro com presentes e com palavras de carinho em momentos inesperados. Títulos, alianças e afins não sustentam nada. Não é só em novela que relacionamentos de 30 anos acabam. Conheço relacionamentos de 50 anos que terminaram. Não sei as causas, mas a falta de romantismo é um fator que pode ser determinante. Sei que para nós, homens, é complicado ser detalhista, notar roupas novas, cabelos cortados, mas não custa nada fazer um esforço para elogiar sempre. Elogios em excesso nunca fazem mal.

11) Seja alguém responsável por aumentar a autoestima do seu parceiro. Seja amigo.

Na vida, não são poucas as pessoas que encontramos que estão sempre dispostas a derrubar-nos, deixar-nos para baixo. Não seja mais uma pessoa a fazer isso com o seu parceiro. Tenha sempre palavras de amor, superação, alegria. Levante o seu parceiro e seja o ombro amigo com o qual ele saiba que pode chorar, desabafar. No contexto da antiguidade grega, fazia-se distinção entre quatro tipos de amor: filéo, ágape, eros e stergo. O primeiro diz respeito a gostar de alguém, sentir afeição; o segundo, ao amor de Deus para com a sua Criação; o terceiro, ao amor erótico; e o último refere-se à afeição entre pais e filhos, entre um soberano e os seus súditos, ou mesmo entre um cão e o seu dono. Acredito que um relacionamento saudável deve ser a fusão dessas quatro instâncias, sendo que o descaso com relação a um desses tipos de amor pode ser determinante no insucesso de um relacionamento. Existe um poema do Jorge de Lima chamado "O acendedor de lampiões" que influenciou bastante o meu modo de enxergar o mundo. O poema fala sobre um acendedor de lampiões que é responsável por levar luz para as pessoas, mas que, na própria choupana, talvez não tenha luz. O poema termina dizendo que muita gente insinua nos outros crenças, religiões, amor, felicidade, sendo como o acendedor de lampiões que não tem luz na sua própria casa. Aprendi com o poema que, mesmo quando não estamos felizes, podemos fazer outras pessoas felizes. Mesmo quando você mesmo está para baixo, você pode ser responsável pela alegria de outra pessoa.

12) Seja fiel.

Não seja apenas fiel ao seu parceiro, mas seja fiel ao seu sentimento. Se for engajado com o amor, como disse num item 8, você será fiel ao próprio amor que você sente.

13) Tenha confiança.

Um relacionamento construído sobre desconfiança nunca poderá ser, de fato, saudável. É extremamente necessário que você confie em quem está com você. Se você não tem essa capacidade, é porque ainda não está suficientemente preparado para um relacionamento.

14) Materialize o que você sente.

Não adianta dizer todo dia que você ama o seu parceiro se você não demonstra isso nos seus pequenos gestos, na maneira como você trata-o, com o seu olhar. Tente expressar o que você sente das maneiras mais diversas possíveis. É uma necessidade humana apegar-se a coisas concretas para entender o abstrato; portanto, presenteie o seu parceiro, mas não ache que apenas objetos sofisticados e caros serão responsáveis por manifestar o seu sentimento. Tente ater-se a detalhes, momentos em que você pode mostrar que você, realmente, é alguém com quem se pode contar.

15) Seja cuidadoso ao lidar com o passado, o presente e o futuro.

Não seja o tipo de pessoa que fala insistentemente dos erros do seu parceiro ou que joga diariamente na cara dele fatos desagradáveis do passado. Importe-se com o seu presente. Valorize-o! Dê importância aos poucos momentos em que você pode estar ao lado de quem você ama, mas tenha sempre em vista o futuro — vide item 1.

16) Seja cúmplice.

Cumplicidade é um fator preponderante numa relação. Não tive a preocupação de organizar esta lista de maneira lógica e axiomática, para que ela contivesse o menor número de itens, e a prova disso é o fato de a cumplicidade dialogar com vários itens desta lista. Seja refém do seu amor, tanto do sentimento quanto do seu parceiro. Quando o seu parceiro estiver numa situação ruim, mesmo que ele esteja errado, não o exponha. Seja o primeiro a estender-lhe a mão. Mesmo que ele mereça ser repreendido, faça-o de maneira delicada e privada. Seja, da mesma maneira, o primeiro a defender quem você ama.

17) Relacionamentos têm altos e baixos.

Assim como tudo na vida, os relacionamentos têm momentos em que tudo parecerá estar bem e têm outros momentos em que parecerá que você está vivendo no próprio Inferno. Não se assuste com isso. As próprias alternâncias naturais de humor podem gerar esses altos e baixos. Seja responsável por não ser mantenedor dos momentos ruins, mas sempre procurar melhorar o seu relacionamento.

18) Prime pela verdade.

Não minta, nem omita, mas aprenda a dizer a verdade na hora certa e do jeito certo. Quanto a este quesito em particular, saiba que o fato de você ter razão não lhe dá o direito de fazer cobranças ou de colocar o outro em situação delicada. Comprometa-se com a verdade, mas com bom senso e sensatez. Um relacionamento construído na mentira não dura, gera desconfiança e traz outros inconvenientes.

19) Busque um bom relacionamento com os familiares e amigos do seu parceiro.

Se você pensa em ter um relacionamento duradouro, é imprescindível que você busque dar-se bem com a família e com os amigos do seu parceiro. Nunca diga ao seu parceiro para afastar-se de um amigo, até porque, quando os relacionamentos acabam, os amigos verdadeiros são aqueles que ficam. Dê tempo para o seu parceiro gastar com os seus amigos e familiares: da mesma maneira que ele precisa dispensar tempo para ter um bom relacionamento com você, ele precisa fazer o mesmo com outras pessoas com quem ele se relaciona. É complicado tentar fazer isso quando algumas figuras exóticas e nem um pouco edificadoras surgem, mas busque representar um papel de reconciliador, e não de criador de dissensões. Entenda também que, se o seu parceiro sentir a necessidade de sair sozinho ou fazer coisas sozinho, não quer dizer que ele não ama você ou não sente sua falta ou necessidade de estar ao seu lado, apenas ele tem preferências. Respeite isso.

20) "Um cordão de três dobras não se rompe com facilidade".

Mais uma vez citando Eclesiastes — um dos meus livros favoritos da Bíblia —, deixei este último item para quem crê em Deus, embora ele sirva também para reafirmar o item anterior, já que um relacionamento que tem apoio dos familiares e amigos tem mais consistência. Busque crescer com o seu parceiro em todos os âmbitos: cultural, social, intelectual e, principalmente, espiritual. Coloque o seu relacionamento na presença de Deus. Orem por vocês, busquem-nO! Compartilhem os seus desejos, sonhos e planos com Deus e tentem, juntos, criar um relacionamento de intimidade com Deus.


[1] http://www.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/story/2005/11/051128_amorcc.shtml

[2] http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2009/01/090105_amorpesquisaml.shtml
[3] Tg 1.9

[4] Lc. 6.45

sábado, 3 de outubro de 2009

Educação

Na revista Veja da semana passada, alguns artigos discursaram sobre a Educação; um deles, inclusive, utilizou-se de informações errôneas. Um artigo do J.R. Guzzo, intitulado Ponto de Partida, afirma, por exemplo, que nenhuma universidade brasileira figura entre as 100 melhores do mundo, sendo que a própria revista, recentemente, informou que a USP ocupou a 38ª posição no ranking da Webometrics Ranking Web of World Universities [1]. Mandei um e-mail para a revista informando a incorreção das informações e que, dessa maneira, a revista abre espaço para que seu detratores a denigram. Posso gostar de algo, mas meu gosto não obscurece minha visão crítica.

Quero problematizar na postagem de hoje a temática educação. A Veja do fim de semana passado iniciou minha reflexão e a abertura do XV Congresso de Iniciação Científica da UnB e 6º Congresso de Iniciação Científica do DF deu prosseguimento à minha reflexão tanto pela atitude dos participantes naquele congresso quanto pela audição de uma das palestras. Antes de tal audição, percebi a falta de educação das pessoas que estavam no Congresso: enquanto alguém discursava, os estudantes conversavam, ignoravam quem falava e quando a lista de presença foi passada, quase não era possível ouvir quem falava. Quem conhece a acústica dos anfiteatros, sabe do que estou falando — embora aprecie bastante a estética dos projetos do Niemeyer, há quase 5 anos sinto na pele a falta de funcionalidade deles.

Depois de observar a falta de educação dos estudantes, um palestrante procurou responder para que serve a iniciação científica. Ele respondeu utilizando alguns argumentos numéricos e práticos como, por exemplo, diminuição do tempo de mestrado, mas ele disse que a principal finalidade encontra-se no ser humano em seu sentido mais geral. Acho que o raciocínio pode ser ampliado para o nível do Ensino Superior. Os nossos estudantes saem das universidades melhores do que entraram? Com certeza, eles saem sabendo mais do que entraram; uns, menos, outros, mais. Eles, contudo, são mais capazes de sensibilizar-se com o outro e de transformar o seu conhecimento técnico em sabedoria e cultura? Acredito que, infelizmente, a reposta é negativa.

Que a educação no Brasil está falida há tempos, é do conhecimento de todos; no entanto, acredito que problematizar o assunto e encontrar soluções, de curto, médio e longo prazo, é complicado. Não sei muita coisa de Estatística. O que sei aprendi no Ensino Médio — o que é quase nada — e em algumas matérias da UnB, principalmente, nas de Física Experimental e de Probabilidade; contudo, acho que a lógica é uma ferramenta que pode auxiliar bastante. A OCDE —Organização para a cooperação e desenvolvimento econômico [2] — apontou num relatório recente que o investimento por aluno no Brasil, em comparação com os países membros da organização, que totalizam 30 países, é quatro vezes menor. O Inep — Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira [3] — informa que não houve muita variação na porcentagem do PIB investido em educação entre 2000 e 2007.

A comparação do investimento em educação entre os países a partir da porcentagem do PIB é um instrumento que só deve ser usado para o que chamo de equiparação positiva. Explicar-me-ei. Se o nosso investimento está abaixo de países que têm bons resultados em educação — pode-se olhar o ranking de universidades ou qualidade da produção de artigos científicos como base para tais bons resultados —, devemos esforçarmo-nos para aumentar o investimento porcentual com relação ao PIB; se, contudo, o nosso investimento for igual ou superior ao daqueles países com melhor desempenho geral, deve-se levar em consideração o contingente populacional porque aí entra em questão o dado fornecido pela OECD sobre o investimento médio por aluno.

Se tem uma coisa que me indigna na gestão Lula é a fórmula medíocre para resolução de problemas. Em vez de investir-se na educação básica e no Ensino Médio para que os alunos de escolas públicas possam competir em pé de igualdade com os alunos das escolas particulares, cria-se cotas; em vez de ensinar-se o uso correto da norma culta, simplicaram-na — mais alguns anos de Lula e teríamos uma língua sem acentos como a Inglesa e por aí vai. O novo ENEM, na minha humilde opinião, é uma das maiores burrices nesse país. Fala-se que o raciocínio lógico é privilegiado em vez da decoreba, mas não vi nada disso nos exemplos dados no site do Inep. A maioria das questões são mal feitas e ambíguas. Pra eu acertar, eu tenho de limitar a minha capacidade mental e pensar de modo medíocre. Sempre gostei das provas do Cespe. Não acho que a UnB deva mudar seu sistema de avaliação. Fiz o vestibular depois de quatro anos da minha conclusão do Ensino Médio e passei. Não tenho nenhuma memória extraordinária. Se a prova não exigisse raciocínio lógico, eu, provavelmente, não teria sucesso.

Qual o objetivo de uma prova que não cobra língua estrangeira? É lamentável um aluno terminar o Ensino Médio hoje em dia sem esse tipo de conhecimento. No curso de Física, por exemplo, se um aluno não souber Inglês, dificilmente, ele terá uma boa formação. Nem comento o fato de uma prova não cobrar gramática. Para concluir a análise de dados estatísticos, a UNESCO lançou um relatório global sobre educação muito interessante. Quando tiver tempo, tentarei lê-lo por inteiro. São 264 páginas de análises sobre o quadro geral da educação no mundo [4]. Quando vi que países como Costa Rica e Jamaica investem mais dinheiro em educação do que o Brasil, fiquei indignado. Com relação a Cuba, nem se o Brasil triplicasse o seu investimento, igualaríamo-nos aos cubanos.

Acredito ainda que as mazelas da educação do Brasil encontram-se num quadro mais profundo e sutil. Bertrand Russell, em seu livro O Casamento e a moral, diz algo que nunca percebi. As sociedades podem ser caracterizadas de duas maneiras: por meio do seu sistema econômico ou por meio do seu sistema familiar. A maior parte das análises são feitas no âmbito da Economia. Prova disso é a infinidade de livros que podem ser encontrados em livrarias partindo-se dessa análise. Quando eu era criança, quando sabíamos que algum colega tinha pais separados ou coisa do tipo, ficávamos abismado e, geralmente, esses colegas eram problemáticos. Hoje, a regra é que os pais sejam separados. Sei que posso parecer conservador. Alguns, talvez, dirão que sou defensor de uma instituição falida e que o que ocorria antes era que as pessoas não tinham a liberdade de dar fim a um relacionamento que não funcionava.

Irei de encontro a essas possíveis pessoas que possam opor-se a mim e direi que o que ocorre hoje é que as pessoas partem do pressuposto de que se não dar certo, elas podem terminar a qualquer momento um relacionamento. Uma criança que nasce num ambiente familiar desestabilizado, mesmo depois que já tenha ocorrido a separação, os próprios pais apresentam cicatrizes em sua personalidade que influenciarão no modo como tratarão os seus filhos, principalmente na imposição de limites. O pior é quando os pais não conseguem educar os seus filhos e ainda atrapalham o trabalho dos professores que, na maioria das vezes, sem sucesso, tentam melhorar o quadro. Recentemente, houve uma polêmica sobre o caso de uma professora que mandou um aluno pintar uma parede que pichou [5]. A professora disse que o aluno parecia um bobo da corte e a mãe já quis pronunciar-se em favor de seu filho.

Não consegui achar a referência, mas li sobre a discussão de leis que proíbem os pais de agredi-los fisicamente. Sou totalmente contra. Não vou utilizar a Bíblia como argumento porque acho que nessas questões, temos de usar argumentos lógicos que se apliquem a qualquer pessoa de qualquer pensamento religioso. Uma criança não tem a capacidade de entender certas coisas. Dar palmadas não causa problema nenhum. Não conheço estudos a respeito, mas aposto que se fizessem um estudo a respeito, descobriam que — como diria minha mãe — quem não apanhou dos pais quando criança, apanhou da polícia quando cresceu.

O problema não se restringe ao núcleo familiar e ao investimento do estado, mas em como se investe. O ENEM é o exemplo de uma política mal feita porque foi baseado no SAT americano. Temos de investigar como as coisas funcionam no Brasil. Não vejo problema em importarmos boas políticas, mas devemos ter em mente que o Brasil tem as suas peculiaridades. Da mesma forma, não adianta aumentar os gastos com a educação sem mudar o tipo de política. Conheço muitos professores universitários totalmente analfabetos. Eles cometem erros crassos em plena sala de aula. Não seria a hora de implementar um sistema como o francês no que se refere ao conhecimento da nossa língua?

Alguns países asiáticos criaram políticas para atrair as melhores mentes para o professorado. No Brasil, que perspectiva de carreira tem um professor? Aqui, diminui-se o salário dos professores no mesmo período em que se aumenta o salário de um ministro do STF para quase 26 mil. Um professor da UnB tem de ter mestrado e doutorado, além de 12 anos de docência, para ganhar 8 mil em média. Acho que não preciso argumentar que um professor tem muito mais importância num país do que um ministro de um tribunal.

Para finalizar, eu vou contrapor um mendigo e um professor. Os professores têm um piso salarial de 950 reais. Digamos, para simplificar, que um sinal de trânsito fique verde durante 30s por minuto e digamos que neste tempo ele ganhe 10 centavos. Em uma hora, ele arrecadará 6 reais. Se ele trabalhar 8 horas por dia e 25 dias por mês, ele ganhará 1200 reais! Chegamos a esse valor considerando que ele ganha 10 centavos por minuto, mas se de vez em quando alguém der 50 centavos ele já aumenta consideravelmente o seu ganho. Chega-se à conclusão, portanto, que, neste país, é melhor ser mendigo do que professor[6].


[1] http://www.webometrics.info/

[2] http://www.oecd.org

[3] http://www.inep.gov.br/

[4] http://www.uis.unesco.org/template/pdf/ged/2009/GED_2009_EN.pdf

[5] http://g1.globo.com/Noticias/Vestibular/0,,MUL1313499-5604,00.html


[6] Comentário do senador Cristovam sobre o aumento do salário dos ministros do STF em contraposição ao piso salarial dos professores:
http://cristovam.org.br/blog/?p=3133&cpage=1

sábado, 12 de setembro de 2009

Citações, hipocrisias e migalhas

"O que é primeiro não é a plenitude do ser, é a fenda e a fissura, a erosão e o esgarçamento, a intermitência e a privação mordente: o ser não é o ser, é a falta de ser, a falta vivente que torna a vida desfalecente, inapreensível e inexprimível" [ Maurice Blanchot ]

A frase acima é a que iniciará um novo espaço nas minhas postagens. Já fazia isso nos meus flogs sem muito compromisso; no entanto, pretendo, sempre que postar, colocar uma frase que tenha achado interessante ou que, simplesmente, tenha se encaixado com situações vividas por mim na semana. Eu tinha um "gadget" — não achei um análogo conveniente em Português, já que o blogger usa este termo — intitulado "Frases da semana"; contudo, nunca o atualizei e achei ruim perder as informações sobre as frases escolhidas por mim anteriormente. A mesma coisa acontece com os livros, filmes e músicas na mesma sessão, mas no ano que vem, pretendo enumerá-los anualmente e disponibilizar a lista no fim de cada ano. Enfim, a frase que estréia é a que estava há um bom tempo no "gadget" que foi retirado. Adoro esse papo existencialista...
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Gostei muito da "novela das 8" da Globo que teve seu último capítulo apresentado ontem — nunca entendi por que continuam chamando-na assim. Algumas pessoas devem estranhar, mas estou comentando mesmo sobre uma novela do horário nobre da famigerada rede televisiva. Muitas pessoas costumam meter pau nas novelas, mas assistem aos seriados "americanos" — ainda vou pesquisar por que usam este termo para os estado-unidenses.

Sim! Assim como as novelas estão para o povo brasileiro, os seriados estão para o povo "americano", com a diferença de que acho que a nossa escola de formação artística, seja na área de atuação, direção etc. , é muito superior. Nossas novelas têm histórias escritas diariamente. Deve ser muito mais complicado escrever histórias que mantenham o espectador entretido diariamente do que semanalmente. Se tivéssemos um estúdio como Hollywood ou o apoio necessário, começando pelo apoio do público, não tenho dúvida de que teríamos a melhor fábrica de cinema do mundo. Uma coisa que me indigna são aquelas pessoas ignorantes desconhecedoras da história do cinema nacional que falam que não vêem filmes brasileiros porque só têm pornografia, palavrão, violência e por aí vai. Tudo bem que a década de 70 foi permeada de pornochanchada, mas quem pesquisar sobre a história do Brasil, especificamente os assuntos referentes à censura, verificará que, na época, foi feito o que se podia fazer.

O engraçado é que a produção americana está longe de ver-se livre dos mesmos estigmas que são atribuídos ao nosso cinema, mas ninguém fala nada. Mais uma vez, existe o perigo do reducionismo, sobre o qual já comentei neste blog. As pessoas sem informação e, mais do que informação, cultura, tendem a cair nessa armadilha do prosaísmo. Se as pessoas, em vez de reclamarem de nossas produções, vissem mais filmes nacionais, haveria diversidade de gêneros sendo lançados porque haveria mercado para isso; de qualquer forma, se os filmes são desse jeito, é porque existe mercado pra isso.

Voltando à novela, gosto muito quando as novelas retratam culturas distintas da nossa e trazem informações sobre outros povos. É claro que, geralmente, o retrato é caricato, mas já é um incentivo para que as pessoas dêem-se conta de como a cultura influi na nossa vida. Gostei muito, no último episódio, quando Opash — personagem de Tony Ramos — confrontou-se com sua cultura e religião. Vi algo de nietzschiano nisso. Interpreto o além-homem, ou super-homem como alguns preferem, como aquele que fez uma transvaloração moral. O interessante é que quando ele fez isso, ele atingiu a felicidade, tendo sua família restabelecida.

Na excelente minissérie JK, havia um personagem interpretado pelo Luís Melo chamado Coronel Licurgo. Ele foi um personagem que me marcou bastante. Ele era um cristão hipócrita que pregava as leis da Igreja, mas não vivia de acordo com elas. O seu filho, que tornou-se padre, referindo-se ao seu pai, disse, certa vez, que a severidade costumava andar junta com a hipocrisia. Minha experiência de vida tem demonstrado isso a mim. Não é raro encontrar pessoas acusando outras, acobertando-se de um traje de moralidade, mas que, elas mesmas, têm uma vida totalmente em desacordo com o que pregam e que são, justamente, o que condenam.

Tento não me tornar esse tipo de gente, embora sejamos, diariamente, pressionados a tornarmo-nos mentirosos e hipócritas. Quanto à mentira, confesso que a coloquei num pedestal no qual não sei se ela merece constar. Acho que como tive uma educação cristã e como meu primeiro contato com a filosofia foi por meio de filósofos como Sócrates, Platão e Descartes, sou tendencioso. Acredito que a mesma sacralização que o sexo sofreu por meio do Cristianismo, em vez da banalização que eles costumam pregar que existe hoje em dia, ocorreu com a verdade; no entanto, a sacralização tanto do sexo como da verdade são temas sobre os quais ainda não refleti o suficiente.

Sempre tento não escrever de modo mais objetivo, sem minhas costumeiras digressões, mas acho que minha escrita já confunde-se como penso. O mesmo desprezo que as pessoas têm pelas nossas novelas é mostrado pela Globo e pela revista Veja. Se tem uma coisa que odeio é teoria conspiratória. Acho que temos de ser céticos com relação a tudo, mas o ceticismo exagerado, assim como tudo que seja exagerado, é tolice. Sabe aquelas pessoas que dizem que o homem não foi à Lua, mesmo sabendo nada de Ciência?¹ Existem, também, aquelas que insistem em dizer que a rede Globo é manipuladora, o mesmo vale para a revista Veja etc. .

Quando tinha 14/15 anos e era comunista e boicotava os produtos "americanos", também achava isso da Rede Globo e da revista Veja, mas você vai entendendo mais de Economia e de outros assuntos e vai vendo que a coisa não é tão simples. Na época do plebiscito sobre a proibição do comércio de armas, a Veja fez uma matéria intitulada "7 razões para dizer não". Na época, achei um absurdo, dizendo que a revista deveria ter apresentado razões dos dois lados; no entanto, por que uma revista tem de ser imparcial? Ela não pode expressar opinião? Tudo bem que um jornal informativo tem de ser imparcial, mas não vejo por que uma revista deva sê-lo. O interessante é que as pessoas que costumam recriminar a Veja, costumam elogiar a Carta Capital. Esta revista, no entanto, na época da eleição de Lula, disse, abertamente, estar apoiando-no e além do mais, comprei uma edição especial recentemente que no editorial falava mal da Veja! Nunca vi a Veja fazendo isso; além do mais, a qualidade das matérias nem se comparava a nenhuma edição especial que já vi da Veja.

Quanto à Globo, o trabalho que ela tem feito em diversos âmbitos é de inegável qualidade. Fiquei muito impressionado com a profissionalidade da emissora na ocasião da morte do Michael Jackson. Ele morreu numa quinta-feira; no dia seguinte, no programa Globo repórter, houve uma matéria com entrevistas das pessoas que participaram do clipe que ele fez no Brasil. Fiquei boquiaberto com a capacidade de edição do especial em menos de um dia. Nesta semana, o Jornal Nacional está comemorando 40 anos e não se pode deixar de reconhecer o trabalho que a sessão jornalística da Globo tem feito nos últimos anos. Tudo bem que as outras redes televisivas abertas não têm cacife e nem tradição na área e que só recentemente estão investindo na área, mas isso não desqualifica o trabalho da rede Globo.

¹ Se você acredita nesse absurdo, recomendo a leitura deste site:
http://www.projetoockham.org/historia_lua_1.html

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Eu ia comentar sobre o último álbum do Ludov. Já tinha as músicas mais ou menos comentadas e tudo mais, mas acho que a postagem de hoje ficaria muito longa e, além do mais, gastaria muito tempo pra falar dele aqui, além do que já gastei até aqui. Li num blog de uma amiga sobre o peso da obrigação de escrever com prazos. Espero que continua tendo o prazer de escrever aqui e que isso não se torne um fardo. Minha net está meio lenta e demoraria muito tempo para disponibilizar algumas músicas do álbum também. Tenho ouvido e descoberto muita coisa boa e também estou ansioso para ter acesso aos últimos álbuns da Isabella Taviani, Arnaldo Antunes, Roberta Sá. Consegui ouvir o último do Megadeth e gostei muito. Acho que ele merece que eu o comente aqui futuramente. Como já mencionei, prefiro comentar artistas que conheça a discografia e Megadeth é uma banda que tenho acompanhado faz um tempo já.

Enfim, hoje, colocarei uma música do último álbum da Simone — Na Veia. Gostei muito do álbum, mas acho que o que ela lançou com músicas do Ivan Lins — Baiana da Gema — é insuperável. Eu viciei nessa música. Ela tem uma melodia muito bem feita e é de uma delicadeza sem precedentes. Admiro muito a maneira como a Simone consegue cantar: ela consegue ir do rítmico ao intimista e leve sem se perder. Não é qualquer cantora que consegue fazer isso. A grande maioria, quando não se perde totalmente, dá-se melhor numa praia do que em outra.

Fui procurar de quem era a canção e qual foi a minha surpresa quando descobri que o compositor é ninguém mais e ninguém menos do que Erasmo Carlos! Esse cara é um gênio! Gosto muito do Roberto Carlos, mas, pra mim, ele é a cabeça na dupla de composição Erasmo/Roberto. A canção foi encomendada pela Simone; por isso, não a conhecia ainda. Ele tem outra composição no mesmo álbum, mas, desta vez, com parceria com o Marcos Valle. Virei fã do Marcos Valle por meio da coleção 50 anos de Bossa Nova da Folha de São Paulo¹. Não o conhecia muito bem antes de ouvi-lo no cd da coleção. Fiquei com vontade de comentar sobre esse álbum da Simone, mas vou tentar não me empolgar. Na minha opinião, ela é uma das melhores intérpretes da música brasileira. Recomendo-a para quem gosta de boa música. Eis a letra para quem quiser acompanhar:
Simone - Migalhas
(Erasmo Carlos)

Sinto muito
Mas não vou medir palavras
Não se assuste
Com as verdades que eu disser

Quem não percebeu
A dor do meu silêncio
Não conhece
O coração de uma mulher

Eu não quero mais ser
Da sua vida
Nem um pouco do muito
De um prazer ao seu dispor

Quero ser feliz
Não quero migalhas
Do seu amor
Do seu amor...

Quem começa
Um caminho pelo fim
Perde a glória
Do aplauso na chegada

Como pode
Alguém querer cuidar de mim
Se de afeto
Esse alguém não entende nada

Não foi esse o mundo
Que você me prometeu
Que mundo tão sem graça
Mais confuso do que o meu

Não adianta nem tentar
Maquiar antigas falhas
Se todo o amor
Que você tem pra me oferecer
São migalhas, migalhas...

¹ http://bossanova.folha.com.br/colecao.html

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sábado, 5 de setembro de 2009

Esperanza

Conheci a cantora, compositora e contrabaixista Esperanza Spalding quando vi o Milton Nascimento elogiando-a na TV por ocasião do TIM Festival do ano passado, mas só nesta semana fui ouvir o último álbum dela, lançado em maio do ano passado. Não sei como pude passar tanto tempo sem ouvir a preciosidade que é essa musicista.

Das últimas artistas do jazz que surgiram nos últimos anos, ela é, sem sombra de dúvida, a mais talentosa na minha humilde opinião. Entrei em contato com o jazz tardiamente quando comparado com outros estilos musicais. O meu professor de bateria[1], na época, introduziu-me ao Fusion[2] e, por conseqüência, ao jazz. Com a coleção que comprei da Folha de São Paulo [3]— que tem o costume de lançar excelentes coleções —, conheci um pouco mais sobre o gênero, mas admito que não conheço tão bem quanto outros gêneros.

Acredito, contudo, que a desenvoltura com que a Esperanza consegue tocar e cantar deve confirmar minha afirmação de que ela é a mais talentosa da nova geração do jazz. Até porque ela compõe muito bem também, o que é um diferencial. O referido álbum, de 12 músicas, possui 9 de sua autoria. O cosmopolitismo do álbum é outro fato que me atraiu bastante, dado o fato dela cantar na sua língua materna — Inglês —, em Espanhol e em Português. A pronúncia dela é muito boa. Ela canta duas músicas em Português no álbum. Colocarei "Samba em prelúdio" de Vinicius e Baden porque é a que a pronúncia dela fica mais evidente.

Não vou falar sobre a biografia prodigiosa dela: uma consulta a um Google da vida fornecerá todas as façanhas dela, como, por exemplo, ser a professora mais jovem da prestigiosa escola de música Berklee[4]. É evidente, no álbum, a influência que a Música Brasileira tem sobre ela. Na minha, mais uma vez humilde, opinião, a nossa música é a melhor em do mundo em todos os sentidos e não faço isso porque sou brasileiro, até porque nunca fui muito chegado a nacionalismo. Não comentarei o álbum inteiro, mas para quem gosta de jazz ou mesmo para quem não tem muita afinidade com o ritmo, é uma boa pedida. Colocarei aqui, também, a música "Cuerpo y Alma" que não é de autoria da Esperanza, mas que é uma das melhores do álbum. Impressionante como ela consegue apropriar-se da Língua Espanhola de tal maneira que parece que o jazz surgiu no seio desta língua.

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[1] http://www.verafigueiredo.com.br/danieloliveira_index.htm

Dêem uma olhada neste vídeo em que ele explica a relação entre o Jazz e a bateria:
http://www.youtube.com/watch?v=b_x2eM6lbdg

Outro vídeo sobre Jazz e bateria, com destaque para o Swing:
http://www.youtube.com/watch?v=HLFxBVw43_8&feature=related

Sobre o Bebop e Cool Jazz:
http://www.youtube.com/watch?v=EsQa7YP6Ekk&feature=related

[2] http://en.wikipedia.org/wiki/Fusion_%28music%29

O meu referido professor fala um pouco sobre Fusion:



[3] http://jazz.folha.com.br/musicos/


[4] O vídeo fala um pouco sobre ela. Sou eternamente agradecido ao Pat Metheny por tê-la convencido a seguir a carreira da música



Uma palhinha de um cover que ela fez de uma música do genial Stevie Wonder:

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Vi dois filmes espetaculares nesta semana. Um é um terror, sendo classificado por alguns como "terrir" e outro é um drama. Não conhecia o gênero "terrir" até então. Uma amiga da Dani falou que o filme fazia parte do gênero e fui pesquisar. São filmes de terror marcado por cenas absurdas e exageradas que têm a proposta de fazer rir[1]. O interessante é que o termo foi cunhado por um diretor brasileiro — Ivan Cardoso. Dentro do gênero Horror, existe um subgênero, que começa com a letra g se não me engano, que poderia caracterizar as cenas grotescas de "Arraste-me para o inferno"; no entanto, infelizmente, não consigo lembrar-me de jeito nenhum.

O site Omelete[2] deu 4 ovos para os dois filmes. Não li as resenhas antes de ver os filmes, mas fui vê-los sabendo da enorme chance dos filmes serem bons, já que minhas opiniões costumam coincidir com as do site — diferentemente do que ocorreu com o julgamento da revista SET[3] que comprei nesta semana. Gostei da revista, mas quase nenhuma opinião minha coincidia com a a da revista. De qualquer forma, é bom ver pensamentos discordantes dos seus. Voltando ao filme, gosto muito de qualquer forma de arte que envolva a dicotomia céu e inferno, Deus e o Diabo etc. . São muitas as obras literárias que já li por causa dessa minha afinidade com o tema. Li Cervantes, John Milton, Goethe, Tim LaHaye e Jerry B. Jenkins com essa motivação agregada a outros interesses.

Acredito que foi o melhor filme de terror que já vi. Excelente trilha sonora, atuações muito boas e um roteiro surpreendente. Adoro reviravoltas nos filmes. O final, que não contarei aqui, foi avassalador! O diretor responsável é o mesmo que dirigiu a franquia Homem Aranha. Não sou muito chegado ao gênero porque nunca senti medo ou coisa do tipo ao assistir esses filmes; no máximo, tomo uns sustos por causa do som mais alto em certas horas. Acho que isso se deve ao fato d'eu ter tido uma infância permeada de filmes ilícitos que via escondido na Manchete, Band e afins. Quando o filme era pra maior de 18 anos — quando era criança, era muito comum classificarem os filmes assim —, fazia questão de ver.

O outro filme atraiu-me pelo título em Francês — Le chant des mariées. Sempre que posso, tento ver filmes franceses para treinar o meu entendimento da língua; contudo, o filme, embora tenha alguns trechos em Alemão e Francês, é falado, basicamente, em Árabe. Não sei se a Língua Árabe tem alguma coisa a ver com a Língua Francesa ou se a mistura era proposital no filme, mas entendia várias coisas em Francês misturadas ao Árabe. O filme é polêmico: traz como pano de fundo religião, guerra, sexo, nudez. Há uma cena em que se mostra a depilação nas regiões íntimas de uma menina por conta de seu casamento.

A melhor parte do filme para mim foi aquela em que houve confrontamento entre interpretações do Alcorão. Duas amigas são protagonistas no filme. Uma é judia e outra é muçulmana. Esta casar-se-á com o primo que ama e a outra, com um médico que será solução para as dívidas de sua mãe. Uma inveja a vida da outra. A muçulmana aprende a ler árabe com o namorado e começa a ler o Alcorão por recomendação deste. Ela lê, então, o seguinte trecho:

"(39) Eis o que da sabedoria te inspirou teu Senhor: Não tomes, junto com Deus,
outra divindade, porque será arrojado no inferno, censurado, rejeitado."

No filme, a tradução apresentada é melhor, mas a que encontrei para transcrever aqui foi esta. Após ler tal trecho, ela se afasta da amiga. Num dia, enquanto estava escondida lendo o Alcorão no quarto de seu pai enquanto ele dormia, este acorda e pergunta a ela o que ela estava lendo. Ao ver o que sua filha lia, ele vira algumas páginas e manda ela ler o seguinte trecho:

"(62) Os fiéis, os judeus, os cristãos, e os sabeus, enfim todos os que crêem
em Deus, no Dia do Juízo Final, e praticam o bem, receberão a sua recompensa
do seu Senhor e não serão presas do temor, nem se atribuirão."

Ela, então, aliviada, agradece ao seu pai. O namorado dela estava trabalhando com soldados nazistas e estava impregnado de preconceito e ódio pelos judeus. A lição que tirei disso foi que as pessoas enxergam o que querem nas coisas. Elas não são objetivas. Quem quiser encontrar motivações para o ódio num texto, há de encontrar e quem quiser encontrar motivações para ser amável e tolerante, da mesma forma, há de encontrar. O interessante é que o Islamismo que é tido por intolerante e fundamentalista é muito mais tolerante do que o Cristianismo em certo ponto, já que o Cristianismo diz que o judeu e o muçulmano vão para o inferno e o Islamismo não diz isso, como se pode ver no trecho transcrito acima.

Eu me interesso muito por religião. Li a coleção da revista História Viva intitulada Grandes Religiões[4] e aprendi um pouco mais sobre várias religiões. Há alguns anos, tive a iniciativa de ler o Alcorão, a Bhagavad-Gita, texto do hinduísmo, e até a Bíblia satânica eu comecei a ler, mas não a li toda. Li, também, alguns volumes da Doutrina Secreta escrita pela Blavatsky porque alguns colegas da UnB comentaram sobre a Teosofia e eu não conhecia. Acho que só podemos criar a tolerância quando deixarmos de ser ignorantes quanto àquilo que não conhecemos. Fico indignado quando as pessoas falam da Umbanda ou do Candomblé, dizendo que eles fazem macumba etc. . A macumba é um instrumento musical e os cultos das religiões afro-brasileiras eram caracterizados pelo toque desse instrumento de percussão. As macumbas, portanto, não são práticas para fazer mal aos outros simplesmente. É claro que existem correntes adeptas de rituais para causar mal aos outros, mas não entendo por que as pessoas falam de Apolo, Afrodite de uma maneira e tratam Iemanjá, Oxum e outros de outra forma. Para mim, isso ocorre por causa do preconceito incutido na sociedade brasileira com relação à cultura negra. A mesma coisa acontece com algumas palavras que se originaram de palavras africanas como, por exemplo, a palavra "sacanagem" que vem do dialeto Quicongo e que, tida por palavra torpe por alguns, significa, simplesmente, diversão, brincadeira.

São várias as traduções de nomes de filmes que não entendo. Acho que a tradução literal em vez de "Uma canção de amor" ficaria muito melhor. Enfim, o filme termina de uma maneira muito significativa. As amigas abraçam-se num abrigo contra ataques aéreos. Uma intercede a Deus por meio de frases próprias do Islamismo e a outra por meio do Judaísmo. A mensagem da tolerância tem de ser repassada nos dias de hoje com engajamento. Discutindo com meu tio, que tem doutorado em Teologia, ele me disse certa vez que toda forma de fundamentalismo foi prejudicial na História. Concordo plenamente com ele.

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Terrir

[2] http://www.omelete.com.br/

[3] http://www.set.edicaoeletronica.com.br/


[4] https://ssl430.locaweb.com.br/clubeduetto/loja/categoria.asp?fml=3&ctgr=47